Preta sai de casa Todo dia Pra suar esperança Em cima duma pia Antes de sair o sol ela sai Da periferia Porque toda mulé tem que Cuidar da sua cria E todo domingo Cochilando no colchão Ela prepara a canseira Pra pendurar na arara do busão É a dor, é a canseira, O suor, é a ladeira Eterna segunda-feira Espremida num vagão Preta nenhuma tem nome No meio da multidão E trabalhando todo dia Com o olho fundo Preta não é ninguém E é todo mundo Que os carros na rua Não carregam Que os olhos a toa Não enxergam E todos os dias Logo depois do serão Preta senta a canseira Lá em cima da cadeira do vagão É a dor, é a canseira, O suor, é a ladeira Eterna segunda-feira Espremida num vagão Preta nenhuma tem nome No meio da multidão Ela ora a dor nos contos do seu rosário Mas é o seu Deus quem tem que ser perdoado O homem lhe disse: Seu mal será desculpado Mas a força do ventre é que redime o pecado É a dor, é a canseira, O suor, é a ladeira Eterna segunda-feira Espremida num vagão Preta nenhuma tem nome No meio da multidão