Nobre culto campesino Que, talvez, contrabandeado Ficou assim transplantado No reduto das Missões Ardentes evocações Que o povo ainda cultua Com grande devotamento Reproduz o sofrimento De sete dias atrás E, para que durma em paz Se deve, então, batizar A cruz, sinuelo da cova Demonstrando grande prova De saudade e pesar Comparecem os vizinhos Que moram na redondeza E, aparentando tristeza Ajudam no puxirão Velando a cruz de um irmão Que, uma semana certita Se cambiou de residência Pra morar noutra querência Por vontade do Patrão Segue o ritual do velório Em memórias ao finado Vela nos quatro costados Fita de todas as cores Reza e terço, clamores Em nome do falecido Que foi desaparecido Da convivência dos seus Foi curta a sua passagem Mas cumpriu a empreitada Que lhe foi depositada Por esse mundo de Deus Posando junto das flores Tem um frasco recostado Que também será levado Para o lugar derradeiro Oferta de um companheiro Que amadrinhava balcão Quase sempre em parceria Quando secava, enchia De cachaça com mestruz E, hoje, junto da cruz Com a maior complacência Oferece aquela essência Ao amigo de prazer Nada podendo fazer Pede, na sua oração Que as almas bebam por ele Que já não pode beber No virar da meia noite Segue a conversa em cochicho Alguém chega do bolicho Trazendo meia garrafa Para afugentar a estafa De quem vai amanhecer Segue, então, a benzedura Cruzando um frasco de pura Num silêncio emocional E as velas choram seu choro Pingando lágrimas brancas No lombo do castiçal Causos da velha querência Que muita gente ignora Contam que a canha evapora De junto da sepultura Que se apeia das alturas Alguma alma penada Que não foi purificada E vaga sem parador E chega no bebedor De um sepulcro de campanha Beber um trago de canha Pra esquecer que é sofredor