(Poema) Às vezes, tenho vontade De refazer novamente O que dantes eu fazia, Mas me faltam calmarias Das barrancas do Uruguai. Me falta o grito das aves Escondidas nas taquaras, Expressando notas claras No seu sublime cantar. Tenho ânsias de brincar Com a florzita amarela Da velha maria-mol Que, num tapete de flores, Sorria, cheia de encanto, Enfeitando um pôr-de-sol. Me falta ouvir o retoço De uma tropilha gaviona, Fazendo rufos de cascos Nas guanxumas do potreiro. Me falta ver o campeiro Quando retorna da lida, Trazendo as vistas compridas Para o rumo do galpão, Cevando, no pensamento, Um amargo de bom gosto Para disfarçar as penas Que leva no coração. Me falta ver os arreios, Por cima do cavalete, Trono xucro onde o ginete Se agarra, mui corajoso, Quando o potro baixa o toso, Brandeando rente do chão. Esporas firme ao garrão, Contando de eito em eito, E o gaúcho abrindo o peito Sem saber se volta ou não. Me falta ver os juncais Curvados frente ao altar Das barras do Camaquã. Me falta ouvir o tajã, Num grito de desespero, Anunciando que o chibeiro Rumbeia sem direção, Tendo Deus por proteção Na jornada clandestina, Cortando a proa e o sono Na proa da embarcação. Me falta ouvir os conselhos Que ganhei quando menino Dos meus generosos pais. Os conselhos que jamais Não poderei esquecer. Sem dar-me conta, cresci, Me nasceu barba na cara; Meu cavalo de taquara Não sei que rumo tomou. Por que lembro tudo isso? Porque tenho compromisso Sem esquecê-lo jamais. Isto devo aos amigos Das antigas diversões, Devo à terra das Missões, De São Borja macanudo, Mas devo, acima de tudo, A criação de meus pais. Tanta coisa que nos falta, Que o destino, infelizmente, Não permite refazer. Mas recordar é viver, Nos diz um velho refrão; Por isso, em certa ocasião, Que empeço a parar rodeio Em tudo que se passou, Recordo a perdida infância, Que depois que me fiz homem, Nunca mais procurou sal No cocho do coração.